Carta para uma suicida – dia #12 [sobre Deus]
Sobre Deus
*Por Frederico Mattos
Caixa eletrônico, cabide de emprego, babá de adulto, médico de paciente negligente, psicólogo de quem não cultivou emoções construtivas, juiz de causas egoístas, muitos são os papéis atribuídos injustamente a Deus. Sendo uma figura tão importante certamente merecia mais de nós. Ele merecia cuidar daquilo que a gente realmente não consegue cuidar.
Não parece um pouco deprimente o que se fala em nome de Deus? A especulação sobre o que ele pensa sobre as pessoas faz Ele soar um cara meio burro, meio ingênuo, mau árbitro, intercessor precipitado, autoritário, parcial ao extremo, detalhista chato e quase um ressentido. Explico.
Não raramente as pessoas gostam de atribuir certos tipos de julgamentos que fazem de si e dos outros em nome de Deus. “Deus está te ensinando pelo sofrimento”, o chicote ainda é um bom método? Será que um pedagogo não faria melhor? “Deus me ajudou nas finanças me dando um carro”, sério? Esse foi o melhor investimento para você?, “graças a Deus você sobreviveu!” e graças a quem seu vizinho morreu? “Seu mau comportamento será punido!”, esse toma lá dá cá é o melhor que Deus poderia fazer diante de um comportamento estranho?
Honestamente, essa antropomorfização de Deus fez com que estejamos subestimando a coisa toda, nivelando o intervencionismo divino por baixo.
Isso não teria problema nenhum se apenas ficasse no campo de nossos devaneios, mas não, seguimos nessas visões distorcidas e forçamos para cima dos outros. As vezes parece que as pessoas veem Deus agir como se ele fosse um apostador fanático que palpita em cada detalhe da nossa vida. Isso seria uma infantilização divina, e nem uma mãe exasperada faz isso.
Quando as pessoas reduzem aquele que seria algo como governador do universo ao síndico de um cortiço só podem estar muito enganadas. O contra-senso entre acreditar que tudo foi criado perfeito versus “melhore a minha vida, Deus, porque você ainda não entendeu bem o que eu quero” me parece uma perspectiva bem tacanha da coisas celestiais.
Será que o desafio de Deus deveria ser mais arrojado? Mas colocamos as forças dele para compensar nossa negligência, falta de compaixão e julgamento pobre sobre a vida. Colocamos Deus para fazer a lição-de-casa que é nossa. Para nossa sorte provavelmente ele se mantém bem silencioso para essas pequenezas, nos deixando espernear auto-centrados como formigas debatendo no chantilly.
Caberia a cada um de nós olhar ao redor, notar que não estamos sozinhos no universo, que temos 7 bilhões de parceiros nessa empreitada, que podemos abaixar a crina de orgulho e pedir ajuda, e quando já saídos da UTI ajudar quem está batendo no pronto-socorro. Mas somos reativos, como crianças mimadas esperneando pelos nossos desejos “nobres”. Queremos tudo e não nos divertimos com nada. Talvez se nos ouvíssemos queixando ficaríamos com uma leve vergonha do que imploramos. Com nossa barriga gulosa, em que nada que recebemos é digerido e usufruído, estamos insaciavelmente pedindo. Mal mordemos o almoço e estamos pensando na janta.
Se aprendêssemos 3 coisas daríamos férias divinas:
– lidar com a dor de perder o que temos
– de não encontrar o que desejamos
– receber o que não queríamos
E veja bem, a sensação de ter um colo invisível quando tudo o mais falha tem uma importância fundamental. Há que passe bem sem esse colo, outros veem como fundamental, de qualquer forma é preciso não abusar.
Eu poderia arrogar-me ser um tradutor de Deus (inventando algum mandamento) e ouvir no silêncio de suas sábias não-intervenções cotidianas dizendo: “se comeres o fruto dessa Terra agora não precisaria do fruto de amanhã, a cada dia basta a sua alegria”…
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8. Sobre ser filho
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20. Sobre dever e obrigações
21. Sobre amizades
22. Sobre fé
23. Sobre traumas
24. Sobre remédios psiquiátricos
25. Sobre dependência emocional
26. Sobre beleza
27. Sobre Justiça
28. Sobre merecimento
29. Sobre perdão
30. Sobre recomeço
* Frederico Mattos: Sonhador nato, psicólogo provocador, autor dos livros Relacionamento para leigos (série For Dummies)[clique], Como se libertar do ex [clique aqui para comprar] e Mães que amam demais. Adora contar e ouvir histórias de vida. Nas demais horas cultiva um bonsai, lava pratos e se aconchega nos braços do seu amor, Juliana.
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Frederico A. S. O. Mattos CRP 06/77094