O inferno são os outros
* Por Juliana Baron
Como o que eu entendo como defeito dos outros, pode dizer muito sobre mim mesma.
Como mencionei no meu último texto por aqui, estou passando por uma fase de adaptações na minha vida, nos meus objetivos e nas minhas escolhas, mas isso não se deu apenas por conta da nova gravidez, mas também porque estou tendo acesso a novos caminhos através de novas fontes, como a Psicanálise, por exemplo. Há dois meses comecei a fazer análise e nesse semestre, começamos a estudar essa disciplina na faculdade.
Confesso que não vem sendo um exercício fácil lidar com a teoria de Freud (e um pouco de Lacan), porque por mais que eu não esteja buscando na graduação uma solução para os meus próprios dilemas existenciais, é praticamente impossível não me projetar nos assuntos discutidos em aula e passar a manhã refletindo sobre mim mesma.
E um dos meus questionamentos mais recorrentes vem sendo identificar porque alguns comportamentos de certas pessoas me incomodam tanto. Garanto que você já ouviu também que aquilo que mais te incomoda no outro, pode dizer muito sobre você mesmo.
Gente, isso dá um trabalho imenso. Juro que sinto uma preguiça enorme quando percebo que algo em alguém está me incomodando demais, porque não é tarefa assim tão simples fazer a identificação com as minhas partes que não costumo assumir. Não é a melhor coisa do mundo, você enxergar no outro o que tanto teme ser. Para ajudar, costumo sempre me fazer a seguinte pergunta: O que no outro faz com que eu me sinta incomodada, criticada, instigada, mexida…? De vez em quando, também funciona trocar o “Ela/ele é…” por “Eu sou…”.
Para aliviar, entendo que essa correlação entre o outro e eu, não quer dizer que se eu critica a desonestidade de alguém, por exemplo, eu também seja desonesta. Penso que usar o outro como reflexo de mim mesmo deva acontecer quando o jeito de alguém me tira o sono. Usando o exemplo da desonestidade, se quando você fica sabendo que alguém foi desonesto e esse tema vira o seu assunto preferido por dias ou se você gasta horas falando sobre isso, é provável que o tema desonestidade diga algo sobre você. Não necessariamente que você seja desonesto. Talvez você, ao contrário, possua um filtro muito rígido a respeito da honestidade. De qualquer forma, são grandes as chances de que se algum ponto de outra pessoa lhe tira a tranquilidade, é porque de alguma maneira, ele faz referência a você mesmo. Nem que seja alguma questão que esteja embaixo do seu tapete psíquico, porque o que varremos lá para baixo ao longo da vida, apenas não aparece, mas não deixa de existir.
Podemos levar esse questionamento para os dois lados da relação. Quando somos aquele que se incomoda com o outro e quando percebemos que sem motivo algum, incomodamos outra pessoa. Esse último caso acontece muito quando você realiza uma mudança na sua vida e obtém sucesso. Pode apostar que logo algum amigo se mostrará incomodado com isso. Nesse exemplo, serve como dica usar uma frase que escutei dia desses: “Qualquer problema que você tenha comigo, é seu”.
Para que o exercício de se enxergar no outro também possa ficar um pouco mais leve, saiba que assim como o que eu enxergo como defeito no outro, pode dizer muito sobre mim mesma, o que eu admiro em outra pessoa, também. Qualquer coisa que signifique uma identificação sua com alguém tem o poder de dizer algo a respeito de você porque só podemos reconhecer no outro aquilo que nós mesmos somos.
Pensando sobre esse texto, lembrei-me da famosa frase de Sartre, que por fim escolhi como título desse texto, “O inferno são os outros”. Considero a colocação quase como uma ironia porque é tão mais “fácil”, depositar no outro, todas as nossas angústias, aflições e culpa-lo por tudo de ruim que acontece conosco e com o mundo.
A verdade é que vivemos em sociedade e é impraticável pensarmos a nossa vida sem esse outro, que tanto nos incomoda. Esse outro que insiste em refletir uma imagem distinta da minha.
Portanto, uma solução seria encararmos essa relação, esse aprender a conviver com esse “sujeito infernal”, como um desafio diário e eterno. Quem sabe não aproveitamos para utilizar o outro como uma ferramenta que nos possibilita nos conhecermos melhor? É tão fácil notarmos os defeitos alheios, mas e os nossos? Vamos dar utilidade às nossas criticas e fazer bom uso desse espelho que está o tempo todo à nossa disposição.
Questione-se, “o que no outro faz com que você se sinta incomodado, criticado, instigado, mexido…?”.
Bom exercício!
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* Juliana Baron Pinheiro: casada, mãe, mulher, filha, irmã, amiga, formada em Direito, aspirante à escritora, blogueira e finalmente, estudante de Psicologia. Descobriu no ano passado, com psicólogos e um processo revelador de coaching, que viveu sua vida inteira num cochilo psíquico. Iniciou uma graduação para compartilhar com os outros a maravilha da autodescoberta e que acabamos buscando aquilo que já somos. Lançou seu blog “Psicologando – Vamos refletir?” (www.blogpsicologando.com), com textos que retratam comportamentos e sua caminhada no curso de Psicologia.