Perca seu tempo!

* Por Juliana Baron

Sim, começo o texto com um verbo no imperativo, coisa que o consultor literário com quem eu trabalho, não suporta. Desculpa James, mas prometo que a ordem é por uma boa causa.

Assistindo ao programa Saia Justa, dia desses, lembrei-me de uma crônica do Carpinejar (do seu livro “Ai meu Deus, ai meu Jesus”) que eu gosto bastante. Ela se chama “Tempo é ternura” e fala sobre a necessidade de perdermos tempo, principalmente, nos relacionamentos. O autor ergue a bandeira de que “perder tempo é a maior demonstração de afeto” porque defende que perder tempo, “sair daquele aproveitamento máximo de tarefas”, nos dias de hoje, é uma gentileza para com o outro e para consigo mesmo. E é sobre essa perda de tempo consigo que eu venho escrever hoje.

Tempo

Confesso-me uma viciada na arte de preencher os minutos/segundos ociosos, como aqueles que passamos dentro de um elevador ou os que duram uma escovada de dente. Criei uma auto política de que sempre dá para otimizar o intervalo entre um afazer e outro, nem que seja para ler o parágrafo de um livro ou responder um email. Parece brincadeira? Mas pense no que você também faz para não perder tempo. Ou o que você vem deixando de fazer por achar que tal coisa é uma perda daquilo que, literalmente, vale dinheiro nos dias de hoje.

Trago alguns exemplos de Carpinejar para ajudar na reflexão: arrumar as gavetas da escrivaninha, “levar uma manhã para alinhar os quadros, uma tarde para passar um paninho nas capas dos livros e lembrar as obras que você ainda não leu”.

Porém, ao mesmo tempo em que me vejo ansiosa por possuir uma lista de tarefas que sei que consigo conciliar num mesmo período de tempo, para não o desperdiçar, o que acontece muito quando eu chego em casa à noite depois de ter buscado o meu filho na escola e preciso fazer milhares de coisas antes que ele tenha sono, também me confesso uma adoradora da arte de perder tempo, apesar de nunca ter usado essa denominação antes. Amo arrumar meus armários e o faço com certa frequência, amo perder a hora lendo um livro, amo gastar horas da minha vida jogando conversa fora, especialmente, com o meu marido. E além de amar, eu procuro fazer. Claro que o fato de eu estudar o que eu gosto, de eu “precisar” ler para dar andamento aos meus projetos e de eu precisar separar um tempo para pensar e deixar as minhas ideias fluírem, ajuda e muito nessa frequência com que eu “perco o meu tempo”, no sentido de fazer algo que não, necessariamente, vai resultar ou vai ser produtivo. Mas é um exercício constante essa coisa do se entregar ao prazer de fazer ou de não fazer alguma coisa. Muitas vezes quando vejo, já estou com dez navegadores abertos, já estou olhando para o relógio e pensando que eu deveria estar fazendo outra coisa que…

E você? Também sofre desse mal de querer estar sempre ligado, aproveitando cada minuto do seu dia e da sua semana? Carpinejar diz que “viver tem sido adiantar o serviço do dia seguinte” e não é que ele tem razão? Estamos sempre adiantando e parece que sempre surgem mais e mais tarefas, deveres e compromissos.

Como você deve estar percebendo, eu ando me dedicando mesmo a essa ideia do estar presente, do focar a minha atenção, do silenciar os estímulos externos que me assaltam o tempo todo, do distinguir aquilo que é urgente daquilo que é importante. E sabe o quê? São nos períodos em que eu exercito essa nova crença, em que eu perco o meu tempo, que eu mais me encontro. Como diz a crônica, eu produzo sentido da absoluta falta de lógica. É quando eu me desvencilho do relógio, da cobrança por produzir, por preencher a minha agenda, que eu posso me ouvir e posso deixar fluir as melhores ideias, os melhores textos e as reflexões mais profundas.

Por isso, sugiro que você também perca seu tempo! Quem sabe, entre uma lacuna e outra, entre uma ausência e outra, você não esbarra naquilo que vem procurando.

Nem sabe o que está procurando?

Então, penso que é chegada a hora de você se perder para poder se ganhar.

 

 

Baron* Juliana Baron Pinheiro: casada, mãe, mulher, filha, irmã, amiga, formada em Direito, aspirante à escritora, blogueira e finalmente, estudante de Psicologia. Descobriu no ano passado, com psicólogos e um processo revelador de coaching, que viveu sua vida inteira num cochilo psíquico. Iniciou uma graduação para compartilhar com os outros a maravilha da autodescoberta e que acabamos buscando aquilo que já somos. Lançou seu blog “Psicologando – Vamos refletir?” (www.blogpsicologando.com), com textos que retratam comportamentos e sua caminhada no curso de Psicologia.

About the author

Sonhador nato, psicólogo provocador, apaixonado convicto, escritor de "Como se libertar do ex" e empresário. Adora contar e ouvir histórias de vida. Nas demais horas medita, faz dança de salão e lava pratos.

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