Por que devo ser mais culto?

* Por Eduardo Benesi

Ser culto ao meu ver passa longe daquele esteriótipo de pessoa que faz cara de imbecil pra um quadro de museu e tenta explicá-lo de forma acadêmica. Ser culto tem a ver com a nossa capacidade de absorver e expandir emoções. É uma autopermissão pra sensibilidade. É entender-se de forma profunda. É uma quebra com as nossas piores crenças e preconceitos. Conheço gente pobre que é culta e gente rica que é pura ignorância. Ser culto é um estado de espírito. Não é entender tudo, mas é estar aberto a, é deixar encostada a porta da alma. Nesse texto, listo reais motivos – ou não – para que você de mais importância ao seu repertório de vida, para que você busque de forma divertida pedaços seus que você desconhece:

Devo ser culto porque só assim passo da esfera do turista para o virtuosismo do viajante. O turista dá “check” em tarefas pré agendadas. Cumpre créditos superficiais. O viajante se entrega ao sabor do inesperado, faz de qualquer momento uma paisagem, interage ao redor, se livra da coleira de guias prévios.

Ser culto é muito mais que conhecer autores cults

Ser culto é muito mais que conhecer autores cults

Devo ser culto porque isso mais do que nunca virou um critério de desempate universal. Seja no plano das relações sociais quanto no mundo profissional. Quem não quer algúem interessante para conviver no cotidiano do escritório. Embora a aparência e o lado estético sejam critérios levados em conta no mercado de trabalho e também em hierarquias sociais, isso acaba com o tempo virando algo dispensável. Lembrem-se: beleza depois de uma semana vira tédio visual. Cultura é o nosso lado infinito, é a impressão que vai além de um rostinho simétrico. Beleza muito tem a ver com o quanto você é refém do que os outros enxergam você. Cultura tem a ver com o quanto você se olha, se conhece, se permite, se expande.

Devo ser mais culto porque toda a vivência cultural consiste em constantes exercícios de reflexão , visão de mundo, posicionamento, capacidade de autonomia nas decisões, além de ser o fermento mais potente da criatividade.

Devo ser mais culto pra aprender mais sobre minhas emoções. Consumir cultura é uma espécie de indução aos sentimentos. Estar aberto as emoções é uma forma de curar diversos bloqueios de relacionamento, moldar a nossa realidade de mundo, nos pintar com lápis de cor.

Devo ser mais culto porque só Pedro Almodovar vai me fazer entender que uma cor é feita de várias outras subcores, que podem ser rasgadas, estouradas, enlouquecidas, que podem inclusive despertar sensações. Porque só Woody Allen brinca com nosso poder de adivinhação e coloca destino e acaso em pleno processo de bem ou mal me quer.

Devo ser mais culto porque vou finalmente ter um motivo para usar aquele óculos “de grau” estiloso mesmo que ele seja fake.  Óculos de grau sempre rende um mistério e uma sofisticação em nossa aparência. Óculos de grau é quase uma vitrine que divide os nossos olhos e o mundo que nos observa. É um convite ao outro para nos descobrir além das lentes.

Devo ser mais culto pra aprender a entender quando e como sou manipulado pela mídia, pelo sistema, pelo meu chefe, ou pela minha mãe. Estamos sempre participando de jogos sociais mesmo sem perceber. Jogos que muitas vezes são tóxicos e degradantes.

Devo ser mais culto para me interessar mais por quem são as pessoas ao invés do que elas tem. Pra entender que o conceito binário de bem e mal é uma bobagem. Que somos todos uma mistura dos dois. Para desconstruir o maniqueismo.

Devo ser mais culto pra ter subsídios no momento de defender uma ideia, para ter a coragem de mudá-la, para saber escolher  as opiniões que eu compro. Ser culto é também ser mais seletivo com as calorias invisíveis que ingiro no cotidiano.

Devo ser mais culto para ter coragem de perseguir sonhos altos, pra querer merecer o alcance das coisas, para ser menos religioso com as minhas culpas, e aprender a traçar estrategias sociais a partir de um filme ou uma peça de teatro.

Devo ser mais culto para descobrir o que significa e vivenciar uma epifania:  aprender a perseguí-la , identificá-la, gozar de um jeito que você nunca pensou.

Devo ser mais culto para num ser mais um. Pra ter a coragem de me assumir diferente. Pra contestar ao invés de me entregar ao conformismo medíocre do senso comum.

Devo ser mais culto porque estar em contato com outra cultura nos diferencia, nos singulariza, nos diminui de tamanho mas aumenta nossos espaços de existência.

 

 

benesi* EDUARDO BENESI é Pedagogo, consultor cultural, formou-se também no teatro para atuar escrevendo. É um hispster inconfidente que carrega bandejas com cebolas gigantes para viajar o mundo, e o seu rodizio é de terça-feira. Pede tudo sabor queijo, da abraço demorado e tem um site em que coleciona pessoas e instantes: o www.favoritei.com.br