Faça mais e sinta menos (será?)
* Por Frederico Mattos, psicólogo
Se eu pudesse reduzir o maior problema da sociedade contemporânea em um único ponto seria o medo de viver. Estranhamente é o que as pessoas dizem que mais buscam, viver.
A maioria associa diretamente a sensação de viver com condições externas, como ter uma casa maior, uma viagem incrível, um trabalho realizador ou um relacionamento de cumplicidade.
No entanto, quando precisam colocar todo o coração nessas áreas da vida recuam. A casa nova sustenta o êxtase por alguns meses, a viagem parece mais interessante na hora da volta para casa (ou nas fotos de rede social), o trabalho dos sonhos parece trazer uma sensação indigesta de sobrecarga e o relacionamento se revela sempre insuficiente e insatisfatório.
E isso tem uma razão de tão óbvia que nem reparamos, o que constitui o sabor de estar vivo é exatamente aquilo que negamos, escondemos e fugimos o tempo todo, os sentimentos, os desejos, os sonhos e a real alegria de usufruir a vida. Basta dar liberdade para uma pessoa e ela tenta se agarrar em alguma certeza pré-concebida ou algo familiar e seguro. Diante de um sonho ela recua para seus medos e desconfianças, se fecha em possibilidades catastróficas e desiste antes mesmo de tentar. O orgasmo, que para muitos é o ideal de prazer também não é buscado com muito afinco, parece que existe uma febre por gozar, mas não desenvolver uma relação mais profunda, relaxada e entregue para o orgasmo, aquele que você sente quando está num contexto de absoluta aliança com um outro corpo. Estamos preferindo uma vida de prazer imediato e isso não tem muito a ver com a degustação da vida, é o vinho de má qualidade que se toma, sem nenhum sabor efetivo.
As pessoas buscam atingir seus sonhos e depois não sabem o que fazer com eles, continuam se sentindo insuficientes, entediadas e em busca da próxima dose de meta-sonho-realização. É uma sociedade que faz de mais e sente de menos, por isso faz as pessoas atingirem altos postos na vida e mesmo assim sentirem que são um fracasso como pessoa humana.
Admiramos a pessoa fria, racional, que não se deixa afetar por nada, quase um robô, quanto mais produtiva melhor. Mesmo os que tentam se apartar desse contexto dito “capitalista” adotam um outro tipo de vida “simples” pautada em arrogância frente aos consumistas. Também não está em paz, não raro precisa ficar alterada para sentir algo de significativo, caso contrário parece que a vida não chega por vias normais.
Essa anestia emocional coletiva que nos impomos ao buscar a carreira perfeita, o trabalho incrível, a vida for a de escritórios e o amor de uma vida tem asfixiado a todos. Soltar da pressão, da auto-crítica e do julgamento exagerado de tudo parece não ser uma opção, é quase um vício aceito como normal.
Certa vez um rapaz disse para mim “Fred, parece que tenho tanto em minha vida que sinto que não vou dar conta, parece que algo vai tirar minha alegria a qualquer momento, não consigo usufruir”. Isso é exatamente o que acontece com as pessoas que tem medo de viver, elas próprias criam ladrões de felicidade mesmo quando sentem uma faísca de bem-estar, parece que nunca há merecimento o suficiente para gozar de alegria genuína. O monstro está sempre preparando uma armadilha na próxima esquina.
Como o futuro sempre parece ameaçador é bem comum que as pessoas sintam uma necessidade de acumular garantias, aposentadorias, muito dinheiro, muito status para não terem que precisam de ninguém. Não querem sentir junto com os outros, compartilhar seus temores da velhice ou lidar com a ideia perturbadora de que a morte pode esbarrar com ela a qualquer momento. Não vai nem para frente e nem parar trás, fica empacada num presente temoroso, que também não é fonte de satisfação.
Quando deslocamos o centro do nosso bem-estar da ação para a emoção o colorido da ação ganha força, sentido, expressão real…
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* Frederico Mattos: Sonhador nato, psicólogo provocador, autor dos livros Relacionamento para leigos (série For Dummies)[clique], Como se libertar do ex [clique aqui] e Mães que amam (demais livros e cursos [aqui]). Adora contar e ouvir histórias de vida. Nas demais horas cultiva um bonsai, lava pratos e se aconchega nos braços do seu amor, Juliana.
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Frederico A. S. O. Mattos CRP 06/77094