Carta para uma suicida – dia #13 [sobre doenças]

Sobre doenças

*Por Frederico Mattos

Existe uma beleza na maneira como eu vejo uma doença, parece que a natureza criou mecanismo de “melhor aproveitamento possível mesmo nas piores condições”. Vejo as doenças como uma proteção do sistema pessoal para evitar o desligamento global do aparelho. Ao invés de uma pessoa morrer porque quebrou o pé, o corpo cria um inchaço ou uma impossibilidade de andar, evitando da pessoa sair andando e se lesionar de novo. A doença me parece estar a serviço da vida.

Mas nós aborrecemos com ela, achamos que é um maquinação diabólica do nosso corpo que conspira contra nossa felicidade. Imagina alguém que usou bem mal o seu estômago seguir podendo usar mal. O corpo dá uma barrada nela.

Como o corpo é um mecanismo incrível é bem orquestrado inevitavelmente com o uso e os costumes de alguém ele vai pifar num ponto ou outro, é uma máquina biológica incrível, mas é um sistema que depende de outros sistemas para operar bem. Ao dar defeito poderíamos simplesmente pensar: “como posso melhorar ao máximo meu funcionamento mesmo em uma situação difícil?”. Acho estranho ver como brigamos com a vida no adoecimento. É verdade que tudo fica mais difícil, mais lento, mais chato e não podemos manifestar o nosso pleno potencial. Mas a vida não tem dessas coisas?

Tenho uma reserva muito grande, apesar de tudo o que disse, em culpabilizar alguém por ter uma doença como se ela fosse um sintoma indireto de qualquer comportamento pessoal. Não há como responsabilizar alguém por seus pontos-cegos. Lembro uma vez que uma mulher que atendi é que se tratava de câncer me confessou: “Fred, eu mereço essa doença, tive muita mágoa na vida, certamente isso é resultado desses sentimentos.”. Confesso, fiquei condoído, uma pessoa além de enfrentar a dureza daquele período enfrentava um estigma social infundado sobre o câncer. Respondi a ela: “se o câncer for resultado de mágoa, então nenhuma pessoa sobreviverá ao câncer, inevitavelmente todos carregam mágoas mais ou menos persistentes na vida. Não faça essas associações que podem parecer dar respostas mágicas e culpabilizar você por suas doenças. Agora, independente do que causou precisamos atravessar isso da melhor forma. É o que nos cabe e importa”.

O alívio no rosto dela foi imediato e fiquei me perguntando qual seria a utilidade de alguém saber sobre mágoas quando o corpo está pedindo uma ação compassiva e doce no aqui e agora. Certamente transformar uma pessoa com uma doença numa pessoa doente não ajuda muito.

As doenças são uma aviso para olhamos para a vida possível, o melhor dentro do pior cenário. Com essa perspectiva talvez não olhássemos com tanto desprezo para os impasses corporais ou com culpabilização…
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*Frederico Mattos, psicólogo clínico e escritor
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* Frederico Mattos: Sonhador nato, psicólogo provocador, autor dos livros Relacionamento para leigos (série For Dummies)[clique], Como se libertar do ex [clique aqui para comprar] e Mães que amam demais. Adora contar e ouvir histórias de vida. Nas demais horas cultiva um bonsai, lava pratos e se aconchega nos braços do seu amor, Juliana.

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Frederico A. S. O. Mattos CRP 06/77094