17 formas que o cinema pode mudar a sua vida
*Por Eduardo Benesi
Quando você passa a se considerar um cinéfilo, é porque de alguma forma o cinema começou a fazer parte da sua vida de uma forma especial, seja em forma de companhia, ou como um catalisador reflexivo. Eu sou o tipo de pessoa que não consegue ficar uma semana sem ir ao cinema, e isso envolve o deslocamento ao lugar cinema, não apenas ver um filme bom. A partir disso, gostaria muito de dividir com vocês descobertas, pensamentos e ideias que eu fui aprendendo a partir do meu processo de aproximação com a sétima arte e que podem despertar novos olhares e sabores:
1- O segredo das pipocas vendidas naquele cinema de todos os Shoppings.
O meu primeiro choque em relação às redes de cinema de shoppings foi saber que elas faturavam mais em pipoca do que em filmes. Foi nesse momento em que pensei; “essas pipocas devem ter algum preparo especial, porque as de casa nunca ficam iguais”. E elas realmente têm. O segredo não está bem na pipoca, mas sim no óleo: geralmente é utilizado um tipo solidificado de óleo feito de coco ou canola, que agrega um corante amarelo sabor manteiga em sua composição. Outro segredo é o fato do sal ser adicionado ao óleo antes do preparo, e isso permite que o sabor se espalhe igualmente pela porção.
2- O ritual da locadora
Você entra e fica namorando cada poster de lançamento, e como quem não quer nada, pede ao atendente que guarde para você quando algum deles for recolhido. O filme que eu quero está alugado, mas eu adoro pedir dicas e depois retribuir com outras. Fuçar na sessão separada por diretores. Eu ia levar um filme só, até saber que naquela semana tem aquele combo do tipo alugue 4, pague 3, e zas.
Eu sempre serei desses que não abrem mão do ritual da LOCADORA!
3- Não caia na comparação livro x filme
Isso parece um tanto óbvio, mas um filme adaptado dificilmente fará jus ao livro. Uma adaptação fílmica é um recorte particular feito através do olhar de um diretor, e por esses dois motivos, você está fadado à decepção caso se atente a isso quando for conferir o resultado. O filme que consegue expressar a ideia de um livro mesmo não mostrando todos os detalhes, geralmente acaba sendo muito bom.
4- Todo mundo é mestre de todo mundo
Eu sempre me aborreci um pouco com pessoas convencidas de que somente o que ELAS consomem em termos de filme, é bom ou garantido. Acho que amigos “estrategicamente confiáveis” em termos de gosto são uma importante curadoria para que você vá direto ao ponto no sentido de filtrar obras boas, ao invés de perder tempo com filmes fracos ou dispensáveis. Eu, por exemplo, vou coletando sinais: um amigo comenta no Facebook, eu vejo uma manchete com crítica positiva em algum site confiável, o outro colega avalia bem o filme no Filmow (rede social para cinéfilos). Isso é um termômetro para que eu saiba intuitivamente se um filme vale ou não a pena, lembrando que você pode também contrariar o mundo, e ir ver um filme que todos odiaram e de repente acabar gostando, comigo já aconteceu.
5- Saiba extrair o melhor de um filme pipoca e um filme cult, consciente do que você pode esperar de cada um.
Quando falo em gênero, me refiro mais à divisão entre filme pipoca x filme alternativo. Obviamente um filme pipoca (blockbuster, comédia romântica, sci-fi apocalíptico, besteiróis americanos) é mais voltado para entreter, para que você fique pilhado durante a projeção, e é feito para aqueles dias em que estamos com preguiça de profundidades. Dentro da linha “quanto mais milhões melhor”, confesso que recorro a esses filmes quando quero apenas me distrair. É claro que eu acho que existem “filmes pipoca” que possuem mensagens construtivas e relevantes, mas isso é menos comum e não vejo problema caso ele seja mais raso. Já um filme mais alternativo foca no pós-projeção também: é um tipo de cinema que não nos abandona na saída, que costuma ter simbolismos implícitos que exigem um nível de entrega e compreensão maiores, já que focam em detalhes mais artísticos, sejam pela fotografia ou mesmo atuações mais cuidadosas.
6- Desfrute de silêncios e olhares
O preciosismo do cinema está naquilo que não é dito, na elipse, no subtexto, na sugestão. Filmes com longos silêncios são lindos de serem percebidos. É no silêncio entre os diálogos que percebemos se existe verdade na troca dos olhares, se uma obra é preenchida de fluidez, se existe presença dos atores. Sempre depende mais do olhar do que da câmera, e uma pessoa certa vez me corrigiu e acrescentou: depende mais do estar, do que do olhar em relação á câmera.
7- Divagações dignas de Tabloide
Coisas que eu sempre pensei sobre o mundo de Hollywood: A Carey Mulligan é a Katie Holmes que deu certo, a Cristina Ricci tem cara de feto, e eu nunca sei quem é a Jéssica Alba ou a Jéssica Biel, mas eu acho as duas bem ruinzinhas. Acho sempre delicioso qualquer filme apocalíptico que envolva o Will Smith ou o Tom Cruise, e acha que a Uma Thurman nasceu para os filmes do Tarantino. Adoro filmes dirigidos por atores, estilo George Clooney ou Selton Mello. Eu sinto saudade da Winona Ryder e de filmes de terror anos 90 (estilo Pânico). Acho que o Matt Damon nunca será bom o bastante porque existem Brad Pitt e Leo DiCaprio. penso que apesar de ser uma excelente atriz, a Julianne Moore não sabe escolher papéis, e eu sempre acho que o Macaulay Culkin morreu mas aí ele aparece vivo. Kathy Bates é a atriz que protagonizou a minha cena predileta no cinema, que é do filme “Tomates verdes fritos”:
8- Poucas coisas no cinema são tão divertidas quanto eleger um diretor (ou vários) e acompanhar sequencialmente a sua obra
Woody Allen é um diretor que possui uma produção sistemática, geralmente faz um filme por ano, e isso resulta em longas que se revezam em nível de qualidade. Tim Burton possui marcas muito características em seus filmes: fotografia pálida, a presença de Johnny Deep e de Helena Boham Carter (sua esposa) e trilhas sonoras instrumentais fantasiosas. Tarantino faz filmes sangrentos e espirituosos, e o exagero de sangue é tanto que o que era pra ser trágico começa a ficar cômico.
E eu poderia citar diversos diretores que você DEVERIA ACOMPANHAR, mas isso é assunto para outro post.
9- “Só os clichês são verdade”
Eu nunca vou acusar um filme de ser ruim, pelo argumento dele ser clichê. Nós provavelmente já vimos muitos filmes com o mesmo tema, e muitos deles nos tocaram, mesmo sendo previsíveis. Não, eu não espero que um filme seja sempre mirabolante, eu acredito nas sutilezas e as escolhas no jeito de contar, como fatores os fatores mais relevantes para definir um filme como bom ou não. O “como acontece” às vezes é muito mais ecoante do que “o que acontece”.
10- Vá ao cinema sozinho
Ir ao cinema sozinho: uma arte, um esconderijo nas horas difíceis, uma liberdade. Ir ao cinema sozinho é das coisas mais deliciosas de se fazer na vida, ainda mais se no combo houver uma pipoca durante ou uma praça de alimentação depois. Se você nunca o fez, experimente, se já fez , pratique! Ir ao cinema sozinho permite que você passe a encarar o cinema com uma importância maior. Se você usa o cinema como um pretexto secundário em um encontro, acaba não aproveitando o filme tanto quanto se estivesse sozinho. Mas continue também indo ao cinema acompanhado, trocar impressões com quem está junto é sempre legal .
11- Nunca avalie um filme pelo final
Essa é a lição que eu julgo ser a mais importante de todas, e quem me ensinou foi uma escritora que muito me inspira: Elaine Borges. Eu escuto muita gente dizendo que não gostou de um filme INTEIRO somente porque não gostou do final, e pior, não gostou do final porque ele não foi conclusivo. Eu encaro um filme como uma “mini-vida” que passa diante dos meus olhos, que geralmente tem uma hora e meia de duração, e eu procuro aproveitar cada momento visual, sonoro e sinestésico que ela me proporciona, desde o começo, e eu não consigo achar que ela só vale pelos seus cinco últimos minutos. Um filme não é uma conclusão, é tudo aquilo que vem antes disso, é um durante, um começo, uma olhada, um gestual, um pós, um filme pode ser tanta coisa que eu só consigo avaliar como injusto e reducionista achar que um filme só importa por causa do seu final.
12- Ir à mostras e pré-estreias
O burburinho, o público cheio de tipos diferentes, gente da arte infiltrada nas salas, palestras com diretores e atores dos filmes, as filas, as reações do público, o calor, o clima, o ineditismo das obras. Poucas coisas são tão apreciáveis em termos de cinema quanto frequentar esse circuito de mostras especializadas ou pré-estreias com participações prestigiosas.
13- Encare os trailers como um mundo a parte
Sou desses que encaram trailers quase como curtas metragens, emancipando-os da responsabilidade de atestar a qualidade de um filme. Um trailer é feito pela arte da edição, e eu já vi casos de o trailer ser infinitamente melhor do que o filme que ele propagandeia. Trailer é um aperitivo feito para despertar nosso apetite, tentando não entregar nenhum detalhe importante do filme. Abuse de trailers mesmo que seja depois de ver o próprio filme.
14- Um filme faz um bom papel, quando ele consegue mexer com você, mesmo que te deixe mal.
Sempre que estou em uma sala em que as pessoas começam a deixar a projeção por não suportarem o que estão vendo eu penso: “esse filme promete ser muito bom!”. Não acho que o papel do cinema é sempre nos fazer sair sorrindo da sala. Penso que temos que sair mexidos, mesmo que isso signifique um embrulho, um enjoo, uma tristeza. Geralmente as pessoas confundem o “não gostar” com “não achar agradável”. Um longa que te deixa mal, geralmente está lhe prestando um favor, está acessando sentimentos seus que foram cutucados graças a esse estímulo. Achar um filme desagradável é um caminho de autoconhecimento, é despertar emoções adormecidas que podem ser um treino pra vida real, o cinema é um treino luxuoso para aprendermos previamente algo sobre as nossas emoções. A sétima arte é cheia de filmes ótimos e desagradáveis, tome cuidado para não associar sempre a agradabilidade de um filme ao seu nível qualitativo.
15- Não se apegue apenas ao Oscar
O Oscar é uma premiação sempre questionável, uma vez que usa critérios políticos e publicitários para premiar um filme. Quantos filmes vencedores do Oscar de melhor filme nos últimos cinco anos você se lembra? Existem três festivais durante o ano que trazem diversos panoramas e tendências sobre o olhar artístico do mundo, que não se restringem apenas ao cinema norte-americano – que de fato é muito bom, mas não é uma unanimidade. Cannes, Berlin e Veneza são ótimas vitrines mundiais para que você saiba o que está por vir em termos de cinema novo, além de festivais como Sundance e Toronto que privilegiam filmes independentes, de onde geralmente despontam as zebras concorrentes ao próprio Oscar.
16- Existem filmes bons que a gente não gosta e filmes ruins que a gente adora.
Farei aqui uma confissão: eu achei “2011 uma odisseia no espaço” um tédio, um filme devagar, que me despertou sono, mas que ainda assim, achei uma obra prima, uma profecia em forma de arte, um filme necessário ao mundo. Contraditório? Um filme bom que eu não gostei, mas que eu sei reconhecer que é bom. Enquanto isso, existem filmes que jamais seriam premiados por suas qualidades técnicas, mas que marcaram do jeito mais delicioso a minha infância: Jumangi, Esqueceram de mim, História sem fim, Goonies, Jurassic Park, O milagre veio do espaço, Querida encolhi as crianças, Caça Fantasmas. Filmes que eu mesmo, tecnicamente, não apreciaria, mas que eu me permito gostar pelo link afetivo que eles me despertavam.
17 – Você não precisa “decidir” se gostou de um filme assim que ele acaba
Gostar de um filme ao meu ver é um ato contínuo, um cultivo, pode ser perecível, envolve uma pré, presente e pós concepção. Sim, eu me influencio com opiniões minimamente confiáveis não a ponto de deixar de ver mas a ponto de criar essa ou aquela expectativa antes de assistir. Eu já amei um filme pelo trailer, por uma crítica bem sacada que li antes, por uma música inesquecível, já amei um filme por ser o filme predileto de alguém que admiro. Teve filme que me ganhou só porque a Julia Roberts sorriu, e já passei a amar um filme que antes detestava porque 10 anos depois ele passou a me lembrar de tempos queridos. Já favoritei um filme nos meus rankings mentais e semanas depois sem explicação ele passou a me despertar preguiça aguda. Já odiei um filme porque não estava em um dia bom, feliz, no clima, com dor nas costas e depois da terceira vez até o poster eu pendurei na minha parede. E como não amar um filme que mesmo que não tão bom, seja precedido de um bom papo ou termine num jantar dos deuses. Eu sempre tive isso de encarar o cinema como alguém que existe antes, agora e depois, e as coisas mudam, eu mudo e todo o porquê disso é vida que passa e os meus gostos que se transformam.
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* EDUARDO BENESI é Pedagogo, consultor cultural, formou-se também no teatro para atuar escrevendo. É um hispster inconfidente que carrega bandejas com cebolas gigantes para viajar o mundo, e o seu rodizio é de terça-feira. Pede tudo sabor queijo, da abraço demorado e tem um site em que coleciona pessoas e instantes: o www.favoritei.com.br