Memória: por que lembramos e esquecemos a vida?
As pessoas dão pouco valor à memória e acham que é uma função mental secundária em relação à inteligencia, compreensão e capacidade analítica. Mas ninguém LEMBRA de um detalhe, sem memória não há refeição mental que você possa produzir, afinal é a memória que retem todos os dados para que você prepare o prato que quiser.
Me lembro de amigos que já deixaram o sapato na geladeira e quase calçaram o chuchu. Outro ainda estava com um objeto na mão e sequer lembrava para que tinha pegado. Fora os esquecidos de plantão que deixam a sua vida e a dos outros de pernas para o ar.
A pouca importância que damos para a memória pode causar verdadeiros desastres na vida cotidiana. Conheço muitos casais que brigam com grande frequência por conta da falta de memória de um dos dois (ou ambos) ou de profissionais que tem seus empregos em risco pela falta de memória.
Mas, afinal, o que é a memória?
De forma bem básica a memória é um processo mental (com bases neurológicas) básico de captação, armazenamento e evocação de informações em curto, médio ou longo prazo.
Os maiores problemas de memória acontecem em uma dessas três etapas.
Captação
Na captação o estímulo ou a experiência vivida é introduzida no sistema mental atraves dos cinco sentidos como sons, toques, cheiros, gostos e imagens. Grande parte das pessoas falha nessa hora, pois costumam fazer tantas coisas ao mesmo tempo que mantem baixa qualidade de apreensão da realidade à sua volta. Se você ingeriu informações quebradas e truncadas a probabilidade de evocá-las é muito pequena. Nessa hora é essencial que esteja concentrado na hora de fechar a porta de casa, do carro ou entregar algum documento. Pequenos rituais de memorização são importantes como falar em voz alta a ação que acabou de fazer ou sempre manter os objetos em lugares parecidos em casa, na bolsa ou mochila.
Estudos tem revelado que conseguimos administrar apenas 7 estímulos por vez, e isso é chamado memória de trabalho. Um garçom que anota seu pedido consegue organizar essas informações por um curto período e descartar essas informações que seriam inúteis de serem armazenadas.
Armazenamento
Essa é outra etapa essencial que poucas pessoas percebem, pois não basta captar um estímulo é preciso guardá-lo de um jeito que seja bem fácil para tirar de lá. A maior parte das pessoas “pega” um objeto e joga num quarto escuro, ou seja, ficará muito mais tempo para encontrar o que guardou, se é que vai encontrar.
Costumo dizer que cada pessoa encontra seu próprio jeito de organizar as ideias. Eu costumo imaginar ou ter a sensação de uma grande árvore ou teia no qual vou pendurando as informações e associando com ideias e imagens parecidas. Isso me ajuda a memorizar nomes de pessoas, já para os numeros eu invento uma musiquinha que me ajude a ter ritmo para memorizar numeros de telefone. Outra coisa que ajuda é separar as informações ou números em grupos de quatro, isso explica porque os números de telefone e CPF são melhor memorizados quando divididos em pequenos agrupamentos. Existem diversos métodos disponíveis, cada um escolhe o seu, mas o importante é perceber que quanto mais bem acoplada uma ideia estiver melhor irá ser resgatada.
Evocação
Essa é a hora final, pois nesse momento é que saberemos se vamos lembrar de algo realmente. Se você ignorou o momento da captação e armazenou indevidamente uma informação não irá conseguir evocar de forma precisa. Isso quer dizer algo simples, não é que você tenha problema de memória, mas não desenvolveu (por preguiça ou ignorância) um método adequado para lembrar o que precisa.
Entenda algo importante, sua vida é um composto de memórias que se relacionam com emoções. Sua personalidade é resultado dessa comunhão entre fatos, emoções e memória. Se você tem baixa capacidade de treinar sua memória e deixa qualquer tentativa de evocar uma informação de lado a probabilidade disso afetar seu bem estar é muito grande.
Memória e emoções
Os neurocientistas vem fazendo grandes descobertas à cerca do papel das emoções na memória. Traumas, mágoas e momentos felizes tem o mesmo potencial de fixação na mente humana porque tem a colaboração de uma cola imbatível: uma emoção.
Emoções como raiva, medo, tristeza, alegria e amor podem fazer você manter uma lembrança por muito tempo armazenada em sua mente. Esse é o motivo porque temos dificuldade em perdoar um desafeto ou esquecer uma pessoa amada. As memórias que levamos delas estão muito carregadas de afetos difíceis de desassociar.
Isso ajuda a entender que a memória não é um fato definitivo, pois de acordo com o significado que damos à uma memória (que associa ideias, valores e emoções) ela pode revelar diferentes significados.
Pense na foto de um amor machucado, na primeira vez que a foto foi tirada ela revelava uma impressão, no auge das brigas outra e no término ela era completamente outra coisa. O que revela que os fatos são volúveis em nossa mente e não são fechados, nós podemos “mudar nosso passado” ao dar novos significados a eles. Mas para isso é preciso ter coragem de abrir a caixa de Pandora para oferecer novos ares e outro colorido para aquilo que antes considerávamos um trauma.
Memória e a passagem do tempo
O sentimento de passagem do tempo também é outro fator agregador associado à memória. Você só sente que o tempo passa por que retem memórias sobre aquilo.
A passagem do pode parecer mais acelerada ou lenta de acordo com as memórias que você estabelece. Uma vida rotineira e monótona produz a sensação de que o tempo foi pouco aproveitado pelo simples fato de que existem poucos marcos psicológicos. A monotonia comprime o tempo, a novidade o expande e proporciona uma sensação de longa e boa vida. Por isso que temos uma sensação de riqueza quando viajamos para lugares exóticos ou vivenciamos marcos importantes em situações e com pessoas novas.
Um experimento foi realizado em que o pesquisador se refugiou numa gruta por 2 meses totalmente isolado de pessoas e de luz. A sensação de passagem demorada do tempo o fez perder a noção da realidade de tal modo que ficava acordado 36 horas ininterruptas e outras vezes apenas 8 sem que tivesse exata percepção. Quando a equipe foi retirá-lo no dia 14 de setembro ele afirmou que ainda era 20 de agosto.
Memória e relacionamentos
Seus relacionamentos pessoais podem melhorar muito quando sua memória funciona de forma precisa, afinal o sentimento de carinho que as pessoas nutrem está relacionado com a imagem que você GUARDA delas. Uma pessoa arrogante tem a tendência a captar poucos estímulos e estar pouco envolvida emocionalmente com a realidade que a cerca, por isso sempre parece distraída, entediada ou reclamona. Sua memória é curta por conta de sua visão estreita de mundo, mas falar que é ESQUECIDO é melhor do que alegar que é presunçoso. Você que é esquecido tem um alto potencial de ser um orgulhoso disfarçado de distraído.
Boa memória social é um sinal de generosidade e capacidade de empatia, porque denota que a pessoa realmente prestou atenção ao que o outro falou e esteve emocionalmente envolvida. Se você tem alguma dúvida disso observe uma pessoa que perdeu a capacidade de se lembrar de si e dos outros como um portador de Mal de Alzheimer e comprovará.
A capacidade de memorizar informações e imagens emocionais positivas sociais das pessoas também permite que seu sistema mental opere numa lógica otimista e criativa. E todos adoram estar ao lado de uma pessoa assim, ao contrário de uma pessoa ranzinza que só se LEMBRA do que deu errado.
Memórias e trabalho
A criatividade esta ligada diretamente à memória de qualidade, pois nada mais é do que a associação de memórias que parecem totalmente diferentes focadas na solução de um problema.
Se você é um vendedor e retém a memória dos clientes que atende terá muito mais sucesso numa segunda abordagem com o cliente do que um vendedor esquecido ou relapso que simplesmente o ignora.
Você poderá fechar muitos negócios se conseguir estar emocionalmente envolvido neles, sua motivação está intimamente conectada na sua capacidade de memorizar bons gatilhos emocionais em torno de sua autoimagem.
LEMBRE-se que você também é o resultado das memórias que tem de si mesmo. Seu sentimento de mais valia e autoconfiança tem ligação direta com tudo aquilo que resolve guardar ou esquecer de si mesmo. Não subestime sua memória, pois se tiver em alguma situação de risco ou grande decisão ela pode literalmente salvar sua vida.
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