Pare de Ajudar

Amar o próximo sempre foi o tipo de ensinamento unânime e sem contra-indicações. Afinal qual seria o problema de ajudar uma pessoa que precisa de auxílio?

Isso sim é ajuda

Eu respondo qual é o problema: nossa maneira de amar é da pior espécie. Com nossa tendência controladora e prepotente conseguimos tornar a profissão de fé de Madre Teresa de Calcutá e São Franscisco de Assis, Albert Schweitzer algo vergonhoso.

“Você está bravo, Fred, está colocando defeitos até na caridade dos outros!”

Pois é, não estou bravo, mas posso dizer de cátedra que o tipo de ajuda que vejo as pessoas prestando umas as outras tem sido causa de mais confusão do que real ajuda.

Uma historinha ajudará nessa questão. Uma mulher gostava de visitar pessoas em hospitais para oferecer consolo. Certo dia encontrou um doente que estava especialmente abatido. Ela lhe perguntou o motivo e receceu a seguinte resposta: “esses médicos querem o meu mal, não me deixam comer nada e acabei de ver pela janela um homem vendendo deliciosos abacaxis descascados…”. Diante do olhar suculento do interno a mulher deu uma piscadinha e disse que ia resolver seu problema. Driblou a vigília de seguranças, médicos e enfermeiras e trouxe um pedaço de abacaxi para ele e foi embora satisfeita com o sentimento de dever cumprido. No dia seguinte foi visitá-lo de novo e notou que ele já teve alta. “Sim, graças à minha ajuda!”, pensou ela. A enfermeira quebrou a fantasia da mulher generosa: “aquele moço que estava aqui ontem veio a óbito essa noite, teve complicações em sua úlcera gástrica, estamos investigando se ele comeu algo que não devia.”

Esse tipo de ajuda eu dispenso...

O que pensamos ser ajuda nem sempre ajuda.

As pessoas partem de referências diferentes do que é de fato ajudar uma pessoa. Aliviar o suposto sofrimento [leia mais] de uma pessoa pode se mostrar ineficaz. Ajudar a borboleta a sair do casulo antes do tempo pode por a perder a lagarta e a borboleta .

Aliviar um problema pode ser um agravante e não uma ajuda. Revelar algo difícil sobre a pessoa pode ser mais eficaz do que consolar e reforçar suas fraquezas.

Certa vez eu estava fazendo uma sequência de asneiras na minha vida amorosa e um amigo me disse: “Você acha que está conseguindo sair por cima dessa situação, mas você está agindo de um jeito que vai ficar por baixo e se sentindo uma m@#da. Qual a razão para agir desse jeito com você mesmo?”

Ele poderia ter me deixado emaranhar numa história que iria me fazer sentir bem, mas que no fundo estava me prejudicando. Quando me chacoalhou, mesmo a contragosto eu despertei…

É muito difícil estabelecer relações realmente baseadas numa ajuda que amplia horizontes e não numa ajuda que reforça nossas infantilidades.

Existem ajudas que não fazem bem, porque são manipuladoras. Certa vez disse para uma pessoa: “Se você me ama desse jeito não me ame, seu amor me faz mal!”

Normalmente aquele que ajuda vem motivado por um sentimento de culpa e quer se sentir bem e superior. Gosta de ter um crédito moral com as pessoas à sua volta. Ele não sabe ter uma relação com os outros que não seja a de ajudar. Muitas pessoas se escondem por trás dessa máscara de pessoas boas, se ocupam de atividades caridosas o tempo inteiro para não enfrentar seus verdadeiros obstáculos.

“Mas não é melhor isso do que prejudicar os outros?”

Na prática sim, mas para a pessoa não, porque a pessoa que prejudica os outros pode ter mais chances de ser despertada desse sono da consciência do que a pessoa que se sente boa. O bom dificilmente desperta de sua cegueira por que acha que está realmente engajado num processo de autodescoberta. Ele costuma ser pouco honesto consigo mesmo e negligente com o seu real bem-estar.

Atendo muitas pessoas que tem profissão de ajuda como a minha que nunca se cuidaram. Elas reprimem sua hostilidade, seus medos, suas angústias de tal forma que adoecem de uma vez só.

Além do mais, tem uma dificuldade tremenda em serem ajudadas e receber carinho. Dar ao próximo se tornou uma armadura que as impede de receber algo positivo. Ajudar virou uma defesa para não entrar em contato com suas fragilidades.

Portanto, pare de ajudar os outros e realmente ajude, naquilo que o outro realmente precisa. As vezes o que ele precisa é ver você bem longe, perder a muleta e crescer.

E afinal, quem é você para saber o que é o melhor para alguém? O que é O MELHOR para alguém?

*

Esse é o quarto texto da série PARE:

Já tivemos o Pare de bater Punheta, o Pare de drama emocional e o Pare de reclamar

Os próximos são Pare de (se) justificar.

Pare de (se) machucar

Pare de (se) corrigir/consertar

Pare de (se) controlar

Pare de (se) acusar

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About the author

Sonhador nato, psicólogo provocador, apaixonado convicto, escritor de "Como se libertar do ex" e empresário. Adora contar e ouvir histórias de vida. Nas demais horas medita, faz dança de salão e lava pratos.

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