Crônicas da Vida – A Velha Empacada
Por Mariana Martinho*
Na longa fila do caixa ele aguarda com a cesta de compras na mão. É sempre uma péssima idéia ir ao super mercado no quinto dia útil do mês, mas ele teve que ir. Devia ter se programado melhor, porém as pequenas coisas do dia a dia o impediram de se lembrar que morava sozinho agora, o que significa comprar a própria comida se quiser jantar.
Ele conta quantas pessoas na fila antes dele – 1 … 2 … 3 … 4 … 5 … 6! Afinal, por que se chama caixa rápido, se demora tanto assim? Já não agüenta mais reparar na blusa lilás feia da mulher à sua frente.
Impaciente, olha para os lados. De repente vê a salvação: na fila ao lado há apenas duas pessoas, um homem já pagando as compras e uma senhorinha empurrando um carrinho de mercado cheio de bugigangas. Sem pensar duas vezes muda de fila. Apesar de a velhinha ter muitas coisas no carrinho com certeza seria mais rápido do que esperar todas as seis pessoas.
A senhora, vagarosamente, começa a colocar as latas de leite condensado sobre a esteira do caixa, uma a uma, tão lentamente que até um jabuti faria mais rápido. Ele olha para a fila que deixou – cinco pessoas.
Quando ela começa a empilhar as 12 caixas de leite sobre a esteira ele se oferece para ajudá-la na esperança de apressar o serviço. Ela nega pedindo a Deus que o abençoe por ser tão educado. Quatro pessoas.
Enfim a velhinha consegue colocar todos os itens na a esteira. Mesmo com o carrinho vazio já afastado, ela se confunde e tem dificuldade para admitir que o último pacote de pão de forma sobre a esteira era dele e não dela (os três pacotes dela já estavam embalados na outra extremidade do balcão). Três pessoas.
A balconista diz o preço, a senhorinha não estava preparada para tanto, abre a bolsa e a carteira, conta até os centavos e pede para a que a moça retire alguns itens da compra. Nervoso ele bate ritmadamente o pé no chão e assobia. Duas pessoas.
Ela entrega as notas para a garota do caixa, deixa cair as moedas todas no chão. Ele se apressa para pegá-las o mais depressa possível e as entrega de volta para a senhora, que mais uma vez pede que Deus o abençoe. Uma pessoa.
Enfim ela termina de entregar o dinheiro. A balconista conta todas as muitas moedas e oferece o troco. A velhinha conta o troco com dificuldade. A mulher da blusa lilás feia sai do caixa ao lado com suas sacolas em direção ao estacionamento.
Vermelho e a ponto de estourar ele se oferece para ajudar a senhorinha a terminar de empacotar as compras, desta vez ela aceita, pedindo, pela terceira vez, que Deus o abençoe. A moça do caixa, enfim, começa a passar as compras dele.
A velhinha vai embora empurrando o carrinho e ele volta sua atenção á balconista que aguarda que ele pague as compras. Ele paga com dinheiro trocado para ser mais rápido.
Ao final do balcão pega suas sacolas: 1 … 2 … 3 … onde está a quarta? Com uma mistura de desânimo e desespero, ele percebe que a sacola do seu pão de forma foi embora junto com as muitas sacolas no carrinho da velhinha.
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Médica veterinária, metida a escritora e gestora de projetos (que!?). Roqueirinha de estilo e conceito de moda peculiares. Extremamente enfática e exagerada, tem a imaginação descontrolada e vive numa realidade paralela. Ama gatos, contos de fadas e ficções and likes to mix up words of 2 different languages at the same phrase! No twitter @ypioka71 / Facebook / E-mail marypuck@yahoo.com.br
É com muita alegria e gratidão que Mariana começa a escrever seus contos de situações comuns que qualquer um poderia ver. Ela trás esses fatos de uma maneira agradável com leve toque de ironia. Muito me agrada. 🙂
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